sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A Madeira na Obra de Marmelo e Silva


José Marmelo e Silva, nasceu na Beira Baixa, mais precisamente na freguesia do Paul, do concelho da Covilhã, a 7 de Maio de 1911, e faleceu a 11 de Outubro de 1991, em Espinho, cidade onde residia desde 1947, e que, em 1987, o agraciou com a medalha do município; sendo que no ano seguinte, também seria distinguido com o grau de «Comendador da Ordem de Mérito».
Marmelo e Silva, estudou no Seminário do Fundão, donde acabou por ser expulso quando tinha 17 anos, por não se ter conformado com a distorcida visão do mundo e a hipocrisia castradora daquela instituição. E em virtude de não lhe haverem abonado a carta de habilitações literárias, foi constrangido a repetir todos os degraus do ensino desde a instrução primária, pelo que só em 1940, se licenciou em Filologia Clássica na Faculdade de Letras da «Universidade de Lisboa», após ter frequentado a «Universidade de Coimbra», onde participou na «Tuna Académica», com a qual visitou muitas cidades do País, e também a Madeira e os Açores.
Em 1936, prestou o serviço militar no quartel do Convento de Mafra, experiência que o inspirou nalguns lances do livro «Depoimento»; e depois de doze meses como soldado cadete, serviu quatro anos na categoria de oficial miliciano do exército.
Desde 1943 a 1947, José Marmelo e Silva fixou-se na Madeira, salvo num curto período de 1946, em que se ausentou na cidade de Lisboa, onde casou com D.ª Marcolina de Oliveira Gomes, tendo ambos vindo para a ilha, aonde residiram desde Setembro de 1946 a Junho de 1947, e leccionaram no «Colégio Académico do Funchal», do qual o escritor foi proprietário.
A partir de 1947, o casal passaria a morar em Espinho, onde Marmelo e Silva pertenceu à direcção do «Colégio de São Luís», de que era sócio; aí ensinando até 1960. Além da docência, impelido pelas suas raízes camponesas, também se dedicou a exercer actividades agro-comerciais.
Desde muito jovem, José Marmelo e Silva mostrou vocação para as letras, tendo colaborado na década de 20 no «Brado Académico», no «Raio» da Covilhã, e ainda na «Mocidade Livre» da cidade de Castelo Branco. Mais tarde, já nos anos 30, utilizando o pseudónimo Eduardo Moreno, cooperou no semanário lisboeta «O Diabo»; e nas décadas de 50 e 60 publicou diversos artigos no «Jornal de Notícias», no «Diário de Notícias» e ainda na revista «Seara Nova», onde divulgou, entre outros, os «Poemas da Ilha de Porto Santo».
Como escritor José Marmelo e Silva publicou em 1932, «O Homem que Abjurou a Sociedade – Crónicas do Amor e do Tempo»; em 1937, «Sedução», (cuja 5ª edição renovada e alterada saiu em 1989); no ano de 1939, divulgou na revista Presença, nº 1, série II a novela «Depoimento», (com 4ª edição melhorada, em 1967); em 1943, editou o livro de contos «O Sonho e a Aventura»; em 1948, «Adolescente» (modificado e passando a denominar-se Adolescente Agrilhoado, com 5ª edição de 1986); em 1968, «O Ser e o Ter», (com 2ª edição alterada em 1973); no ano de 1971, «Anquilose»; em 1983, «Desnudez Uivante»; a 1989, «O Cabo Elísio» (com um excerto publicado no «Letras e Letras» de 5 de Março de 1989); e, finalmente, «Memoriais» ainda inédito.

Foi nos primeiros anos de sessenta, quando ainda estudava Direito na «Universidade de Coimbra», que nos veio parar à mão a 3ª edição da novela «Sedução» de José Marmelo e Silva; um escritor de quem pouco ou nada tinha ouvido falar.
E ainda hoje lembro que fiquei seduzido pela sua linguagem ágil e moderna, embora tão opulenta que me recordou Aquilino. Também entusiasmou-me a rigorosa construção psicológica das personagens, com comportamentos livres de preconceitos e mordaças, onde de permeio com episódios de irremediável frustração e de exagerado erotismo, também pulsavam cenas da mais profunda ternura e humanidade.
E note-se que fiquei muito agradado com esse livro, muito embora nessa época, além de Marx, Gramsci, Sartre e Camus, lesse também com avidez Carlos de Oliveira e todos os neo-realistas portugueses, bem como os seus confrades estrangeiros da resistência transformadora, desde Steinbeck, Faulkener, Hemingwai, Morávia, Pratolini, Pavese, Thomas Mann, Brecht, Malraux, Graciliano Ramos, Neruda e o grande Jorge Amado.
Passado pouco tempo, li também com aprazimento a 2ª edição do «Adolescente Agrilhoado», onde irrompem certos traços autobiográficos do escritor, que nos fez recordar a «Manhã Submersa» de Virgílio Ferreira, e no qual Marmelo e Silva descreveu de forma muito realista o drama psicológico de um jovem expulso do Seminário, onde tinha entrado com grande pureza de intenções, e findara traumatizado e revoltado contra o ambiente perverso, falso e de grande hipocrisia que, inesperadamente, ali encontrou.
Também me recordo que procurei conhecer estudos ou ensaios sobre José Marmelo e Silva, e fiquei surpreendido por nada encontrar que satisfizesse a minha curiosidade, nem sequer no «Dicionário de Literatura» dirigido por Jacinto Prado Coelho, ou na conhecida «História da Literatura Portuguesa» de Óscar Lopes e António José Saraiva.
Apenas ouvi, nem sei bem onde, que esse silêncio ensurdecedor dos seus companheiros de letras, se devia ao facto de naqueles negros tempos em que o fascismo sujeitava o nosso povo a grande obscurantismo e a esmagadora opressão e exploração; José Marmelo e Silva, rendido aos cânones da já serôdia «Presença», se teria afastado das trincheiras dos neo-realistas, e da dura luta pela transformação dessa injusta e prepotente sociedade, votando-se à caterva dos «psicólogos de almas», e ao intimismo egoísta do romance burguês, desligado dos grandes problemas que afligiam o País.

Muitos anos depois, ao compulsar o Suplemento Cultural do «Diário» de 23 de Maio de 1987, órgão de imprensa que lia com muita assiduidade, deparei, com surpresa, que um vasto leque de analistas, quase todos marxistas convictos, dedicava uma longa homenagem a Marmelo e Silva.
Atentamente, apurei a entrevista que Marmelo e Silva concedeu a Serafim Neves, e fez-se luz no meu espírito, quando aferi que o escritor afirmava, peremptoriamente: - «não escrevo para vender livros, escrevo para os escrever. (…) Sou o autor do texto e não das teorias que vieram depois ou que vieram antes. Persigo as minhas histórias e não os comentadores delas».
Deste modo, depressa cheguei à conclusão que Marmelo e Silva apenas se havia denegado a aceitar qualquer tipo de ortodoxia literária, mantendo-se, porém, solidário, fraterno, e atento aos problemas do seu povo.
Na verdade, Mário Sacramento, asseverou que o nosso escritor «é não só um dos casos mais notáveis da moderna literatura portuguesa, mas o que mais fundo exprime e ensaia o significado da arte como libertação do homem – como reintegração do homem. Assim, quando o autor do «Adolescente» prefere, com certa insistência, designar o seu herói por «o adolescente», a dizer-lhe o nome, não está criando apenas uma ambiguidade que reverte à autobiografia, está igualmente emancipando-se dela por um esforço generalizador, que em certos passos aspira ao «ensaio» estrito da psicologia puberal. E, não obstante, que riqueza de concretização, a desta novela! E que variedade e verdade de tipos, (…) originalidade estilística e sugestão humanitária, (…) que talento aquele, capaz de entrançar em realismo de lei o que houve de pior no romantismo decadente. (…)
«Como tantos outros de nós, Marmelo e Silva é um elo entre duas idades, entre dois humanismos – como a adolescência ela própria. E se o primeiro humanismo libertava o homem, individualmente considerado, dos cilícios do preconceito, o segundo recondu-lo, como espécie, à reintegração do mundo».
O entrevistador e crítico Serafim Ferreira também quis deixar muito claro, que «partindo com a chamada corrente «neo-realista», mas antecipando-se-lhe numa mais exacta perspectiva humanista do fenómeno literário, Marmelo e Silva não deixou nunca de se identificar com esse movimento. (…) No entanto, o autor de «Sedução» procurou colocar-se sempre adiante dos valores da corrente, ultrapassar as barreiras de um esquematismo por demais evidente e já tão discutido, desdobrando a sua produção em dois sentidos ou opções diferentes: de um lado, o arreigamento a um mundo real objectivado nas suas razões e desigualdades sociais, visão lírica, sentimental e poética de um mundo a que não deixa sempre de se mostrar preso; por outro lado, a libertação plena de uma imaginação rica em experiência, sinuosa nos labirintos, (…) tendo sempre em conta uma intenção social e histórica bem localizada e escalpelizada em rigor literário que define toda a arte de escrever de Marmelo e Silva».
Por sua vez, Óscar Lopes, depois de analisar, cuidadosamente, toda a tipologia e fatalidade objectiva dos conflitos da novela «O Ser e o Ter» de José Marmelo e Silva; comentou «que nem faltam, sequer, figuras femininas de uma total abnegação económica, a sentimentos que se cruzam sobre a generalizada e mesquinha caça ao «ter», mas definindo-se precisamente por contraste, numa rede de relações balzaquianamente dominada pela distribuição da supervalia. Tudo coisas tão obviamente vividas, ou extrapoladas do vivido, como outras análogas o foram por Aquilino nas «Terras do Demo».
O crítico Liberto Cruz, expressou também um imenso apreço pela elevada estatura do estilo de José Marmelo e Silva, comentando que «apesar de verdadeiro esteta, não se embriaga contudo com o maravilhoso das palavras. Por detrás de cada frase está presente o escritor lúcido, o homem atento ao mundo que o rodeia, o contador excelente de histórias sabendo perfeitamente a grandeza e a função daquilo que se conta».
Manuel Poppe esclareceu ainda que José Marmelo e Silva «não desconhece a alma humana; o que não impede de se manter atento aos problemas sociais do seu tempo e de, acreditando no poder do homem e no valor da acção, angustiada e esperançosamente sobre eles se debruça».
E José Saramago foi de parecer que os livros de Marmelo e Silva dão a impressão «de textos inclusos, como se o autor por pudor, retraimento ou alta sabedoria, tivesse renunciado à total explicação, que por via da regra o leitor espera. As suas novelas assemelham-se singularmente a seres vivos, dos quais nunca se pode dizer «que são assim», por que no minuto seguinte são já «outro ser». (…) É um narrador discreto e reservado. Sabe que o livro tem vida independente da vida do escritor, e, o que é mais importante que sabê-lo simplesmente, sabe-o enquanto escreve».
Pelo seu lado, António Augusto Menano, afirmou, claramente, que «o que se mostra essencial em Marmelo e Silva não é o ter escolhido «determinado ambiente» (o universo da adolescência, da juventude, do seminário, do serviço militar, da escola, da universidade, a vida rural, a vida coimbrã, a vida provinciana), o mais importante, reside na sua acção renovadora, no que Gramcsi designou de «atitude do escritor» … em face desse ambiente. (…) Marmelo e Silva com «Sedução» espanta e abala os críticos, estabelecendo uma ponte entre os presencistas e o neo-realismo. Com «As Sete Partidas do Mundo» de Fernando Namora, «Sedução» afirma-se como a primeira ficção neo-realista. (…)
«Assim, para além de elaborar subjectivamente a relação das personagens com o meio em que se movimentam, Marmelo e Silva realiza, num estilo seguro e vibrátil, a projecção estético-literária que visa a «intencionalidade» e a «apropriação da realidade».
Quanto a António Rebordão Navarro, apelidou de Mestre a José Marmelo e Silva, e afirmou que é inconcebível que a sua obra ainda não tenha atingido o lugar cimeiro que merece. «Os seus livros, lidos e relidos são sempre novos ou não têm idade, concedendo sempre outras chaves, interpretações, espelhismos, velaturas, revérberos, construções, reconstruções, aberturas para recentes labirintos, considerações do corpo próximo da alma, do rancor, e do mistério insondável da existência».
Albano Martins, escreveria mesmo que Marmelo e Silva era um grande escritor, na rigorosa e inteira acepção da palavra. (…) Leia-se a «Desnudez Uivante» e ter-se-á a medida exacta da estatura do autor. Que o é, também, de outras obras exemplares. Um caminho percorrido sem alardes, sem desvios e sem transigências. Não cedendo à tentação do fácil, do gratuito e do (tantas vezes) falsamente inovador».
E Baptista Bastos, depois de analisar a novela «Sedução» e afirmar um profundo respeito e admiração pelas demais novelas de Marmelo e Silva, comentou que «a obra deste escritor discreto, relator ficto do corpo, o corpo entendido como liberdade ou como experiência do sagrado – a obra deste escritor maior possui algo de religioso, de valores e de implicações cósmicas, e nela avulta essa profunda relação causal entre a matriz e o crescimento, entre amor e morte, entre Eros e Tahnatos. (…)
«Um grande escritor, como José Marmelo e Silva, não é «medível». Pode, talvez, ser «mensurável», através da sua própria «desmesura». E como nele não há excesso (excesso de palavras, excesso na composição, excesso nesse equilíbrio entre o antigo e o moderno) eis porque, sem estratégias de glória, sem tácticas imediatas, e precárias porque efémeras, de marquetingue – eis porque ele é um clássico e, a um tempo, um contemporâneo».
Também Luís Miranda Rocha desenvolveu um demorado estudo sobre Marmelo e Silva e os seus livros, comentando «que o que a história diz da obra dele é que ele representa como que uma transição entre a novelística da presença e a do neo-realismo, Quanto ao significado, ele transcenderá razoavelmente os limites deste enquadramento. (…) A obra de Marmelo e Silva exprime um inconformismo e uma revolta perante convencionalismos, arbitrariedades, e um, enfim, decidido empenho na liberdade e nos valores que lhe andam associados e dos quais coragem, audácia e ousadia são os suscitadores de maior elevação. (…)
«As personagens principais dos principais livros de Marmelo e Silva são jovens, recém-saídos da adolescência e fazendo a aprendizagem da adultez. Eu creio que o escritor teve sempre em vista atingir um público assim, de preferência a qualquer outro. (…) Também por isso é ainda essa idade que eu gostaria de pensar que ele tem, como escritor».
Finalmente, Urbano Tavares Rodrigues lamentou que os trabalhos do final do ano lectivo, não lhe dessem tempo para a cuidada exegese que a obra inovadora de José Marmelo e Silva merecia. Todavia, num rápido testemunho assegurou que «o antifascismo sempre se exprimiu corajosamente na obra desse escritor, e que nele também admira a sensualidade avessa ao preconceito, ao policiamento consórcio, e a generosa adesão à causa dos malditos da terra, tão patente no «Adolescente Agrilhoado», curto romance que marcou posição original entre as obras decisivas do neo-realismo. Qualquer coisa de mítico, um certo sopro bíblico assinalou este texto que o tempo não envenenou nem amareleceu.
«A força erótica libertadora de «Sedução» e de «Anquilose», narrativas de límpida análise e observação da juventude, carregador de seiva e de desafio reapareceu, tantos anos volvidos, no imaginoso, por vezes barroco, mas sempre apaixonado e apaixonante romance «Desnudez Uivante». José Marmelo e Silva é um escritor da adolescência, do amor da transgressão, e tudo isso reaparece no cenário insólito da Madeira serranal, sem fragrância de flores tropicais nem folclore turístico, antes devorado de asperezas e tradições, de desejos prementes, que as infracções estimulam, enquanto os sons da guerra de 1939-45 ecoasse ao longe».
Por seu lado, João Gaspar Simões, um dos fundadores da «Presença», comentaria na sua «História da Poesia Portuguesa do Século XX», que «em poucos escritores dos nossos séculos XIX e XX encontramos a vibração do real aliada a qualquer coisa de irreal patente no prosa de José Marmelo e Silva quando ele, efectivamente, acerta no seu tema, que, em verdade, é sempre, pode dizer-se, o mesmo. (…) O tema dos amores frustrados, das mulheres levianas, dos encontros sensuais avulsos, tudo isto misturado com uma sentimentalidade realmente ingénua, podíamos dizer, mesmo provinciana, mas que na focagem multifacetada da narrativa, ganha relevos singulares, imprevistos súbitos, aspectos onde a ferocidade e a ingenuidade, a candura e a perversidade se dão fraternalmente as mãos».

Alguns anos passaram em que pouco soube acerca do escritor, até que em 2003, adquiri a notável impressão da Obra Completa de José Marmelo e Silva, publicada pela editora «Campo das Letras», com um importante prefácio da coordenadora Maria de Fátima Marinho, e excelentes ensaios de Arnaldo Saraiva, Celina Silva, Maria Alzira Seixo, Maria Manuela Morais Silva, Pedro Eiras e Rosa Maria Martelo.
E nos primeiros meses de 2008, deparei-me na revista 41 da «Islenha», com um extenso estudo sobre José Marmelo e Silva, elaborado pelo crítico Ramiro Teixeira, no qual o ensaísta lembrou que muitos dos escritores que aceitaram a «ortodoxia» desapareceram, enquanto Marmelo e Silva «soube caracterizar uma voz sofridamente pessoal para além da circunstancialidade retórica do seu tempo. Por isto, não cabe nas prateleiras das correntes literárias do tempo que atravessou, sejam estas as do «neo-realismo» ou da «Presença»: não tem um pé numa coisa e o outro noutra, tem sim ambos os pés fixados num amadurecimento literário, com todos os seus defeitos e virtudes, que pela perturbação que transportam o fixam igualmente no aquém de todos os «arrumos», de todos os figurinos, de toda a objectivação rigorosa».

Como já dissemos, no período da 2ª Guerra Mundial, José Marmelo e Silva residiu durante alguns anos na Madeira, e desse estreito contacto com a ilha - onde além dos típicos problemas da insularidade acresciam os gerados pelo conflito bélico, e uma tremenda crise económica, social e até moral - resultou, em grande parte, o Romance «Desnudez Uivante» e o conto «O Cabo Elísio»; muito valorizados também pela experiência e conhecimentos do escritor acerca dos labirintos e meandros da vida militar.
A acção desenrola-se em torno duma pequena unidade do exército, amoldada com militares frustrados, mal equipados, bisonhos, ociosos, desmotivados, muitos deles indignados e até revoltados, que sem as mínimas condições de conforto vegetavam num destacamento montado no comatoso e desolador planalto do Santo da Serra.
A personagem principal é um jovem alferes miliciano, intelectual, progressista, partidário dos aliados, recrutado contra a sua vontade, que deplorava a miséria a que estavam sujeitos os militares e o povo da Madeira, o deboche entre a soldadesca, a corrupção, as prepotências e as injustiças; mas que também ele se aturdia e alienava, entregando-se a eróticas libertinagens e uivantes transgressões sexuais, com a Madre dum Convento, a filha do capitão, e a Aninhas e Gracinda, duas camponesas madeirenses.
De tudo isto resultou, segundo Maria Alzira Seixo, «o carácter eminentemente complexo deste texto, aparentemente directo e linear, que a uma leitura de superfície pode parecer apenas incómodo ou incongruente pela insistência na dimensão orgíaca e no palavreado obsceno (se assim fosse, teríamos apenas um escrito de erotismo vulgar), mas que o é pelo que de atitude humana essencialmente se assume entre o trágico duma situação-limite de carência, e a farsa (o quase grotesco) do seu preenchimento cumulativo através dos excessos mais desencontrados e mesmo discursivamente desconexos».

Aclaradas as circunstâncias que demarcam a «Desnudez Uivante» e o «Cabo Elísio», passaremos a resumir e recriar os comentários e alusões referentes às paisagens, aos costumes, e ao difícil quotidiano do povo da Madeira.
O escrito começa por referir que vindo de Lisboa, o alferes miliciano José Luís Jordão, desembarcou na ilha e poucos dias depois desprende-se para o Santo da Serra, para se apresentar no destacamento da sua unidade;
«Do Funchal a Machico, nada de maravilhoso, nada de imprevisível. Nenhuma singularidade tropical. (…) Nisto surge o pormenor que não deverei esquecer nunca. Relanceado da escarpa, na vertical dos nossos pés, o mar ilhéu, mudo, profundo, carbonoso, sem uma ruga nem um risco de asa, intimida-nos como um abismo lunar. Ouvi-lhe o silêncio escuro, o coração parado. Estremeci».
Já no interior, quase a meio da ilha, a carrinha que conduzia os militares estacou para que todos repousassem um pouco, e o alferes procurou um pouco de sombra: - «Entro na floresta onde o verde do loureiro obscurece e o tortulho alastra. Desolador este paraíso de vegetação selvagem, se não fora a esperança de perpetuidade que cintila no intumescer dos gomos, no pespontar dos ramos. E o mistério que nele vive, me prende e se esquiva. Um rafeiro acompanha-me. Observo-lhe o esqueleto, a inteligência. (…) Fura, cheira, rebola-se, goza da vantagem dos quatro pilhares e cabeça aguda do animal genuíno da floresta. Impossível ter o primata adquirido aqui a posição erecta. Neste digladiar teimoso de copas e de agulhas, o bípede é obrigado a rastejar. Eu ou me agacho ou me revolto. Tal o dilema. A vegetação ameaça-nos, sobrevive-nos.
«Detenho-me de preferência nos braços de um azinho idoso. O ulmeiro esbelto perde-se na cinza do ar. Enquanto que o Elísio (assim lhe gravaram na coleira aristocrática) continua a latir, dum esconso a outro, exibindo-me a espaços a glória de ser quadrúpede. Trago comigo este livro para quê? Flui a tarde na irisação de uma gota de água que não cai».

Mais tarde, já instalado no desolado acampamento incrustado no planalto do Santo da Serra, o tempo passava enfadonho e áspero. «O pesadelo era a nuvem; o planalto, o leito. Visceral, do leito à nuvem, o verde luz da vegetação. Musgo ou floresta, tudo a nuvem enrodilha nos seus cabelos tépidos incestuosos.
«Céu negro. Temperatura morna pegajosa. Solidão de mundo ausente. Nem pássaro dentro, nem besoiro álacre. (…)
«Assim escorrem os dias, as noites, a corrupção, a insídia…

Cada vez mais entediado, o alferes recordou quanto tinha sido bem diferente, há cinco anos, quando tinha esdado na Madeira acompanhando um cruzeiro da Tuna Académica de Coimbra. «Uma alegria infinita, fruíamos o espanto-triunfal dos velhos descobridores: mundo exótico, novo, num estado de pureza virginal. Como provindos duma outra galáxia, rodeavam-nos de admiração, de gentilezas excessivas – bailes sumptuosos em nossa honra, moças duma doçura que não há, rendidas! Passeios pela ilha que assombravam. (…) Cortes verticais de grande altura (lembro os 600 metros, no Cabo Girão e as cabrinhas encarrapitadas na face a pique), abismos de água cavados entre montanhas, picos nevados agulhando o céu, cabeleiras de águas ondulantes, rios de flores na cidade…Em suma, um éden acabado de criar. Mas não perdíamos a noção do real... No percurso de tantas maravilhas, as lágrimas da gente que nos olhava da porta das cabanas» …

Os dias iam passando e o militar só não apodrecia de tédio porque de vez em quando espairecia pelas redondezas, «quando a natureza se lhe afigurava propícia. Toda a manhã a nortada varrera as clareiras da floresta, o nevoeiro fragmentava-se, voava em lençóis fantasmáticos que a ramalheira rasgava, sumia. Pela primeira vez, em oito dias de planalto, vi, jubiloso, a brancura do Pico Ruivo, mamilo fulgurante na harmonia azul do céu. (O cão ia comigo?) Maravilha, os pinheiros floridos, baloiçando, zumbindo, quais rodízios suspensos dos brancos cirros que vogavam. Floridas também, e sensuais, as fruteiras do pomar, que logo as laranjeiras me impregnaram do seu cálido odor. (…)
«Retrocedo no caminho que afinal se cobre de musgos e de madressilvas floridas, e observo a levada que o ia acompanhando humildemente, e tão repousada que dir-se-ia dormindo. Que bondade e inocência a da água que vem para nós descida das montanhas! Apraz-me brincar com ela, diverti-la, jogando-lhe bagas de zimbro que, balanceando, por si mesmas se recreiam, e sigo-a até à rampa do lado sul, maravilhado da sua ternura e mansidão, e como nela se debruçam os plátanos a mirar a imagem dos próprios olhos doirados».
A meio do trilho, de novo se rarefez a nuvem que durante algum tempo reaparecera, «e os olhos alongaram-se por abismos e alturas. Árvores até aí espectrais, de visão radiográfica, readquiriam a sua beleza específica da folhagem gorda e oleosa. Já o azul transbordava do céu sobre as quebradas longínquas. E brilhavam de sol branco até à cinta os picos agulhados, onde a noção do real se evolava.
«Iam comigo trabalhadores da terra. Via-os bisonhos, receosos, talvez ressentidos de penas ancestrais… Que pensariam de tão complexa grandeza? Porque nem tudo era fascínio. Escarpas amedrontadoras, declives vertiginosos, águas rugindo, desfaldas arrepiantes… (…)
«- Faz-me lembrar o Bocarral do Inferno – digo interessado para que todos ouvissem. E acenei para um recente desprendimento de rochas que represavam a água no fundo da ravina.
«- Oh!, pior é quando matam, arrastam palhotas, gente a dormir…
«- E na construção de estradas? – interveio um cabo muito afoitamente. – De há um ano para cá, três derrocadas colossais nas obras de S. Vicente – Seixal. Trabalhadores cuspidos da falésia, 700 metros de altura, no meio de avalanches vazadas no ma».

Semanas depois, o alferes subiu quase até o cume dum dos picos do interior da ilha, acompanhado pela filha do capitão que o granjeara no acampamento, «sereia encantatória com olhos de esmeralda nascidos no fundo dos mares, que trazia consigo o aroma e a frescura de flores entreabertas.
«- Estamos «porriba» da nuvem! – Gritou ela, provocadora de alegrias.
«A falésia, - que singularidade inesperada! Uma névoa branca bordejada de oiro colmatava o desnível falésia-mar e convidava-nos ao repouso abissal imperturbável. O manto estendia-se com rigor linear dois metros abaixo dos nossos pés, não urdindo transição semelhante à de penumbra, claridade, luz. O salto era tentador… (…)
«Entardecera… Tudo à nossa volta foi perdendo o encanto das primeiras horas. O Oceano liso-imóvel dir-se-ia fóssil antediluviano. A Penha d´Águia, maravilha suspensa, cinzelagem da água, agora fantasmalhão que amedrontava o vale. Telhados vermelhos trepando pelos socalcos atapetados de verde, sombreados de abacates e anoneiras, - igualmente despidos do seu fascínio: longínquos e de seus donos, sem fruto, sem voz» ...

Passados meses, finalmente, uma semana de férias no Funchal. Ardentes talvez... Constava que já tinham chegado as gibraltinas, refugiadas da guerra…
O sonido monótono do motor apelava ao sono. «Espreito pela janela poeirenta, ângulos, retalhos da vila de Santa Cruz. Palacetes de base roqueira debruçam-se, retribuindo a alva fidalguia ao mar azul henriquino. Outros de igual brancura escondiam-se entre arvoredos da encosta abaulada».
Finalmente, a carrinha estacionou perto do cais. «Vou enfim passear os olhos pela cidade, do mar para a montanha. E o que logo me prende e maravilha é a festa cromática da natureza. Vê-se renascer o sol de Abril nas delicadas flores esplendentes. As ribeiras que dos altos montes se despenham correndo seu destino ao mar, não são ribeiras de água rumorejante espelho da cidade. São torrentes de flores que lhes engrinaldam policromaticamente o leito. Sortilégio! (…)
«Um barco acaba de atracar, e com a avalanche vinda da Pontinha, o «Golden» ficou sem um lugar vago. Fui subindo ao 1º andar e dei com um salão a tresandar de aburguesado, pequenas mesas rés-do-chão, meiples de coiro de javali para adormecer ingleses aposentados, e quase repleto, ele igualmente de fardas de não muita demora. Falavam ruidosamente, esfumaçavam… Domino a curiosidade, enterro-me no estofadão. Começo a desdobrar os jornais, atento aos mapas da guerra».

Os trepidantes dias de férias no Funchal depressa acabaram. «De novo, no Planalto do Santo da Serra, escorrem os dias, as noites, a corrupção, a insídia» …O escritor ainda se espanta como pôde aguentar «três anos de planalto (deserto, gorduroso, enevoado, coberto de vegetação voraz que dir-se-ia absorvente do próprio ar que respirávamos. Coisa curiosa: o vento cilindrava o nevoeiro em grandes rolos que iam por sua vez dissipar-se nos cedros como fusos).

O alferes Jordão recorda-se que pouco depois de regressar desse descanso na cidade, ecoou como refrigério a ordem de marcha para construir uma carreira de tiro nas bandas do Faial. Pelo menos, quebrava a monotonia… e a ociosidade…
«O caminho sumia-se através de massas cerradas de austrálias, choupos e eucaliptos, mas, onde parecia menos impressa a intervenção do homem, arbustos bizarros emaranhavam-se gracilmente em freixos e bambus, salgueiros a amargoseiras. Uma levada fugia sempre à minha frente, ora clara e cantante, ora escondida como réptil, e pressentia-se no extremo do planalto a sua precipitação leitosa, pulverizante, convertida milagrosamente em grande cabeleira branca. Acompanhei-a durante muito tempo, encantado dos seus rumores e negaças. Quando toda a linha do horizonte era já só minha e um silêncio profundo se fez em toda ela, nascido das mais remotas origens e nunca, no decorrer dos milénios, interrompido pelas gerações, dei por mim suspenso desse mistério espantoso de ficar só no meio da Terra inteira.
«Ali trazido, onde ninguém sabia de mim, ou prezaria de nada a minha existência, eu senti, por momentos, angustiosamente, o esquecimento total da morte, semelhante ao duma haste extinta. O Homem apenas sobrevive em comunhão e solidariedade – e sem elas é pouco mais que inútil. Revejo-me ainda hoje jacente nas raízes dum pinheiro marítimo secular, esmagado por esse encontro frio com a fria mineralização do ser. Então vira eu, ao fundo do planalto, o mar longínquo, negro e imóvel, mas tão negro e imóvel como se todos os sinais de vida do planeta expiassem a sua agonia.
«Assim estive, desaparecido e só, não sei por quanto tempo. Finalmente, diante de mim, através das folhagens, um luar surpreendente, níveo-azulado, coava-se e parecia sorrir, como vindo do mundo real, belo como uma aparição sagrada, parecia penetrar-me, encher-me de claridade, iluminar-me o sangue, outra vez fremente, outra vez humano».

A enorme dependência da Madeira, e a dominação esmagadora dos britânicos, perante o autismo do Terreiro do Paço, não escaparam à lupa de Marmelo e Silva. «Fraudes, difamações, suspeitas, vinganças – são de esperar no espaço português, onde os reizinhos são sagrados e sangrados todos nós, muito especialmente nesta ilha que o poder central, de olhos vendados, entrega à voracidade dos monopolistas estrangeiros. (Veja-se o escândalo da cana-de-açúcar, recentemente esbulhada aos naturais, oferecida pelo ditador, de mão beijada, ao seu londrino amigo Hinton). (…) A Madeira jaz ainda na fase da escravatura, retida pelo colonialismo inglês, com as inevitáveis consequências de fome, roubo, prostituição e suicídio».
A tudo isso acrescia a desmedida exploração a que estavam sujeitas as bordadeiras. Num diálogo dramático, uma dessas pobres mulheres desabafava: - «Ah, se soubesses do meu martírio… Bordei, escrava de mim, desde os três anos. Na palhota éramos oito, 16 mãos noite e dia a bordar, e não comíamos senão papas frias de milho, que vinha de África. São precisas ainda hoje 18 horas diárias para um salário de esmola».
Até as pobres adolescentes do asilo de Santa Úrsula no Santo da Serra, eram cruelmente exploradas. O alferes, ainda tentou consolar uma delas, explicando que pelo menos, no abrigo do internato, se livrara da miséria e «dum trabalho precoce.
«- Livrei-me! Qual uma que se livre, de fome bem o diabo a leva, Doze horas a bordar na cadeirinha. (…) – Aos doze anos, passei a catorze horas, é assim, na ilha. A bordar se nasce, a bordar se morre. (…) E mesmo sem pagar impostos, nem medicamentos, os ricaços industriais apavoravam-nos: - Dizem que estavam a sustentar-nos, que lhes rapávamos o dinheiro dos bolsos, a caridade tinha limites (calcule, eles a engordarem à nossa custa!) que nos punham a pão e água… Milhares de criança morriam lá fora à espera de vagas da nossa cama-e-mesa. «Então, rua! Que o cemitério não estava ali para outro lixo…»
E para cúmulo da injustiça, exerciam toda essa exploração, mesmo naqueles ricos tempos da guerras, tão salutares para as exportações e os seus réditos...«O mercado, excepcionalmente favorável sem a concorrência das Filipinas «obrigava-os» a exigir mais horas de trabalho (…) Cresciam à farta os lucros. As crianças começaram a sentir-se a estalar por dentro, com cuspos de sangue… Conclusão, - com o rótulo de caridade, um trabalho ilícito a vários níveis»…

Nem os pachorrentos animais escapavam à monstruosidade que grassava. Numa das curtas deambulações pelas redondezas do aquartelamento o oficial miliciano perguntou a um camponês: «Diga-me só: Aquelas palhotas na rampa, todas iguais, - vive gente ali?
«- Vivem as vacas cegas – e riu espontaneamente… (…) - O meu alferes não sabe? As vacas leiteiras. Prantam-se à manjedoura, depois é até a morte. (…) – Para estarem quietas, o patrão arranca-lhes as vistas, salvo seja. (…) – E já não arredam pé. Esperam sempre o dia.
«- Assombro! Uma negridão perpétua, sonhando com prados verdes…
«- Ora! No mesmo lugar, sem ralações nenhumas… Comem, dormem, dão leite com fartura, engordam, - que mais querem? Tratadas como princesas»! ...

Tal como os bichos, os próprios vilões, boçais e analfabetos, vegetavam flagelados pela exploração e a miséria… Enquanto prosseguia a caminhada, o alferes passeava os olhos pela paisagem. «Além um moinho com palhota anexa, aqui, à beira do trilho, um cortiço esventrado onde vivem crianças selvagens (pai e mãe mendigos).
«Descansaram, por fim, na Venda dos Quatro Caminhos. Havia àquela hora uma atmosfera sufocante, de feira de escravos. A camioneta Burnay, de Santa Cruz, recebe ali, diariamente as natas de leite originárias de Santana, Faial, S. Roque, Porto da Cruz e redondezas. (…) Não há animais de carga nem de tracção. Ainda que houvesse, qual se adaptaria aos milhares de degraus de Babel que ligam abismos do inferno aos do céu? Só o animal humano é passível de tamanha ousadia (e sofrimento).
«No calvário das natas, centenas de trepadores vêm de quilómetros de distância com a carga albardada ao tronco, saco encordoado à cabeça, inundados de suor, descalços, abandalhados, malcheirosos, esbofados, língua de fora, - porventura moribundos.
«(Quem libertará de vez no universo os flagelados do infortúnio?)
«Este que observo de perto descarrega-se ao balcão e logo se precipita para a torneira do exterior. Mas não se lava. Emborca goladas e goladas ruidosas, até que a asfixia o faz rodar, ziguezagueante, por donde veio. Isoladamente, estende-se no musgo humedecido, rola sobre si mesmo, remédio original de estancar o suor. (…) Muitos gesticulam, nem falam, ardem por grogues, sua redenção e morte, enquanto outros, atendidos, bebem, bochecham e, entreolhando-se tacitamente, ainda ofegosos, lembram doentes na hora da extrema-unção».

A decadência e o abastardamento alastravam como nódoa de azeite….
Enquanto caminhava o alferes Jordão ia cotejando:
«As algarvias, e muito especialmente as de Tavira, cidade morta, perdem-se pelos nortenhos. Influência talvez dos cursos milicianos…Assim acontece aqui, connosco. As madeirenses caem-nos aos pés, de joelhos. (…) Põe-se-lhes um dedo, e alas assapam-se. Nada ariscas, nada unhas de gata. Às vezes até gostaríamos duma resistenciazinha estúpida. Mas não. Assapam-se» …
E perturbado, o militar concluía:
«Escondemos em eufemismos as realidades perversas. Apelidamos de ilhas adjacentes a Madeira e os Açores, quando na verdade a colonização a todos nos subjuga. Para estes homens que acompanho, a salvação está no emigrar. Eles confessam-nos. Os senhores da terra vivem em Lisboa, em Londres, também em Roma, e sem remorsos… A Venezuela vai receber a força do trabalho dos analfabetos…(…)
«- E as mulheres?
«- Que se defendam com os bordados.
«- E morram tísicas, não é?...

2 comentários:

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  2. ADOLESCENTE (1948), reeditado em 1958 com o título Adolescente Agrilhoado (ed. revista e aumentada), não pode "fazer lembrar" Manhã Submersa,de Vergílio Ferreira, editada um década depois...

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